ESTÓRIAS COM GENTE DE TRÁSDAPONTE
( IDA À FESTA )
De Ângela Piedade
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Não me recordo de ter perdido nenhuma festa do Avante, a não ser um ano em que estava de férias no Algarve e ainda hoje me censuro de não ter apanhado o comboio para Lisboa, pois quando os meus pais me relatavam o que se ia passando na festa, eu só dizia para comigo: -Bolas,o que é que eu estou aqui a fazer? Nem à praia me apetecia ir,sabem,aquela sensação de que estamos num lugar mas que a nossa cabeça está noutro,como se o corpo não me pertencesse... Mas serviu-me de emenda, no ano seguinte foi a mesma coisa, a festa do Avante calhava sempre quando estava no Algarve,mas desta vez a história não se repetiu,peguei no meu filho e viemos de comboio para Lisboa,onde os meus pais nos esperavam. E a partir daí nunca mais falhei uma festa.
Dias antes, já começava o alvoroço e a excitação da festa.
- Compras-me a EP pai? Vou ficar o fim-de-semana no Seixal e levo o Jaime, palavras mágicas para os meus pais, não quero perder nenhum dia, não me esquecer de levar os ténis e um panamá. |
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E como eu tenho saudades dessa alegria de estarmos todos juntos na festa.No dia da abertura chegávamos sempre uma hora antes, arranjar lugar para o carro não era tarefa fácil,bebíamos qualquer coisa num café próximo e dávamos uma voltinha a ver a feira que se instalava nas imediações da Festa, mas faltando ainda algum tempo antes da hora prevista da abertura, já estava o meu pai a dizer ansioso: -Vamos lá embora que está quase abrir,corríamos queríamos ser os primeiros, uma Festa aguardada um ano inteiro e que estava prestes a concretizar-se! E aos primeiros sons da música já lá dentro não falávamos, emocionados, só o meu filho fazia perguntas, não recordo uma festa do Avante em que o meu pai não se emocionasse, aquele primeiro momento era mágico e as lágrimas que ele tentava esconder, corriam-lhe pela face.
-Pai, vamos à cidade internacional! Dizia eu para disfarçar
e fazer de conta que não o via a chorar. E resultava, com
alegria percorria os pavilhões de muitos países com coisas
lindíssimas, esculturas angolanas e moçambicanas, os
trabalhos embutidos em madrepérola dos palestinianos...
enfim coisas que nunca mais acabavam e que nos fascinavam.
E era obrigatório, fazia parte do nosso ritual, na abertura
jantarmos no pavilhão da Palestina as famosas kebab, havia
sempre fila. Sentavam-se numa mesa e eu ia buscar a comida,
todos os anos fazia isto e já era conhecida dos palestinianos,
pessoal bem simpático que estudava Medicina em Lisboa. |
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Encontrávamos amigos por todo o lado, que convidávamos para a nossa mesa e assim punha-se a conversa em dia, com música ao vivo e jovens muito jovens... Nesse ano houve bienal de pintura e eu, toda orgulhosa, por os meus quadros estarem lá, seleccionaram-me dois, o meu pai tinha o seu livro "Memórias Escolhidas" em exposição com os autores locais e à venda na livraria, uma tenda enorme. Sentíamo-nos duas estrelas de papo inchado quando as pessoas gostavam das nossas coisas. Mas mesmo sem quadros e sem livros, a festa era para nós fantástica, melhor, maravilhosa! Cansava um bocado, principalmente quando estava calor, mas lá arranjávamos um lugar na relva... com tantos espectáculos para ver, a noite era nossa...! Amanhã estarei lá com a minha mãe, algum tempo antes da abertura, quero ser das primeiras e o meu pai irá comigo!
Ângela Piedade |
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E Trásdaponte aqui tão perto |
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