quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Trásdaponte - " A pequena janela do Beco do Alpendre"

A pequena janela do Beco do Alpendre

Parte 2

Os pais da Amélia não nos deixavam atender ao balcão,meninas
bem comportadas ficam a um canto sossegadas a estudar.

Mas naquele dia, por uns minutos, os dois tiveram que sair e foi
quando começaram a chegar os trabalhadores a reclamar por um
um copo de três.

Anda daí, dizia a Amélia com aquele ar despachado,vamos para
o balcão, eu sei o que é um copo de três, é aquele com uma risca
ao meio, abres a torneira do barril, pões um pires por debaixo para
apanhar os pingos do vinho e enches o copo, que eu levo às mesas...
e assim foi o meu primeiro dia de taberneira!

Bebíamos às escondidas todos os pingos que caiam do barril, 
sentadas no chão por detrás do balcão e se as gargalhadas eram
muitas, passaram a ser ainda mais...

Entretanto a Carolina chegou para brincar connosco e avisou-nos
que os pais da Amélia já vinham aí, ela foi a nossa salvação, um
bocadinhos tontas da pinga, retomámos os nossos lugares de 
meninas bem comportadas no canto da mesa.

Nisto chegam os pais da Amélia, muito afogueados e a perguntar
se nos tínhamos  portado bem, mas com aquele ar desconfiado de
que se tinha passado algo e viram os copos de três em cima das
mesas já servidos... ralharam,ralharam...e nós quase a enfiarmo-nos
debaixo da mesa, dizendo que não voltaríamos a fazer o mesmo,mas
por favor não faça queixa à minha avó,suplicava eu!

Com aquele ar franzino de olhos esbugalhados de quem não parte
um prato, lá convenci a D. Ludovina, que só ralhava da boca para
fora, com um coração de ouro...e ela para mudar de conversa disse:
-Não têm fome?

Ufa! Que alívio! Já tinha passado o mau tempo! E não sei se era  
do vinho, mas o facto é que estávamos com fome e foi aí que 
entrámos na minúscula cozinha da taberna com uma janelinha que
dava para o Beco do Alpendre... os famosos ovos estrelados da
D. Ludovina iriam ser feitos numa frigideira pequenina, que parecia
de brincadeira, cheia de óleo e que com uma colher deitava por
cima deles aquele óleo fervente até formar uma capa branca,mas
durante pouco tempo, para não ficarem muito cozidos...com um
pedaço de pão rebentá-los e saborear  de olhos fechados... os
melhores ovos estrelados que alguma vez tinha comido, os da 
D. Ludovina!

Taberna do Elói

Estava na moda a margarina Vaqueiro e a minha mãe só usava
essa margarina para os estrelar, aparecia a Maria de Lurdes Modesto
na TV, a dizer que era melhor para a saúde, blá,blá,blá... e eu a
teimar que os ovos estrelados da mãe da Amélia eram muito melhor!

Sou fraca cozinheira, mas ovos estrelados, faço à moda da taberna
do Elói, ah... mas aquela cozinha que dava para o Beco do Alpendre,
onde brincava e o cheiro delicioso desses ovos que saía por aquela
pequena janela, eram insuperáveis ... os melhores que já alguma
vez comi!

Ângela Maria, vens ou não vens? Sai desse beco que temos
coisas para fazer! Reclamou a minha mãe ...

FIM

                                                                Ângela Piedade






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